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"Falando de lado e olhando pro chão"

  • Foto do escritor: Frank Moreira
    Frank Moreira
  • 19 de dez. de 2016
  • 4 min de leitura

Estava passeando pelo Facebook e tive o desprazer de ver que um bom conhecido de outras épocas estava militando fortemente em favor de Bolsonaro. Não que ele não tenha o direito de gostar do sujeito, pois até tem. Não que eu queira cercear a escolha de alguém em ter uma linha política diferente da minha, pois não quero. Mas de verdade penso que é um sinal de falta de inteligência acreditar que um candidato como Bolsonaro pode trazer algo que termine bem para nosso país.


O Brasileiro é bélico de natureza. Seja escondido atrás de seu pseudo conhecimento político ou atrás do muro da internet, que oferece "anonimato" e um espaço vazio para se manifestar. Todos se transformam quando estão com a caneta virtual nas mãos e é difícil se controlar quando antagonizado em público, até mesmo pela menor questão possível de se imaginar. A linha de apoio a Bolsonaro é a representação mais pura desse traço intolerante e que pretensamente acredita que a revolução violenta, grosseira e, provavelmente, armada, é única forma de termos ordem e progresso.


Bolsonaro é medíocre, no sentido cruel da palavra, pois está longe de ser burro, longe de ser mal informado, se mostra honesto de uma forma que convence e ainda assim escolhe ser o representante do povo através de uma ideia antiga e que nos faz pensar que é impossível um ser humano reunir todas as virtudes que gostaríamos de ver em um possível presidente do país. Houve um momento em que achei que ele abandonaria a versão mais radical de seu personagem e que suavizaria suas manifestações para conseguir mais penetração na opinião pública, mas o que vimos foram mais bandeiras cravadas por cima do bom senso e o discurso de ódio mais uma vez ganhando força. A ideia era acreditar que ele seria mais um folclórico que falaria o que queria, até conseguiria relativo apoio, mas acabaria perdendo como o seu espelho mais velho, Trump, nos EUA. Quando acordamos e paramos para prestar atenção, lembramos que Trump venceu a disputa com Hilary e que isso deu a Bolsonaro um combustível extra para acreditar que é possível sonhar.


Não acredito nele como presidente, mesmo sabendo que o Brasileiro pode ser ainda mais manipulado, mas como acredito que a grande mídia tem medo de ter que se submeter aos caprichos malucos de um militar de carteirinha no governo, espero que ela faça sua parte para enfraquecê-lo, quando chegar a hora. A falta de outros nomes de peso não ajuda em nada, e por mais que Lula seja sempre um ícone quando se fala em eleições, é lamentável termos que pensar que ele é uma possibilidade. Independente de não ter sido condenado por nada, um presidente com o nome associado a tanta coisa suspeita não pode ser bem visto (embora isso limite a lista de candidatos de forma irreversível).




Chico Buarque, em 1970, escreveu a música "Apesar de você" e com ela criticou duramente o regime militar e sua truculência, dando referências do efeito do governo no povo brasileiro e de como nosso país sofria e clamava por mudanças. Médici proibiu sua execução nas rádios brasileiras e somente no final do governo de Geisel houve liberação para exibição pública e, ainda assim, com muito desconforto gerado. Quando questionado sobre quem seria o "você" da música, Chico disse com toda convicção que se tratava de "uma mulher mandona, autoritária" e essa postura o transformou no maior inimigo dos censores da época, resultando em uma perseguição feroz às obras do compositor.


Não vejo uma nova ditadura a caminho, mas vejo que forças ocultas se movimentam nas sombras, esperando, monitorando, tentando ver uma forma de colocar um pé para dentro do nosso governo. Que o povo se lembre da época em que se andava de cabeça baixa, sussurrando com medo, sem saber e onde a pancada viria.


APESAR DE VOCÊ (Chico Buarque)


"Hoje você é quem manda Falou, tá falado Não tem discussão A minha gente hoje anda Falando de lado E olhando pro chão, viu Você que inventou esse estado E inventou de inventar Toda a escuridão Você que inventou o pecado Esqueceu-se de inventar O perdão Apesar de você Amanhã há de ser Outro dia Eu pergunto a você Onde vai se esconder Da enorme euforia Como vai proibir Quando o galo insistir Em cantar Água nova brotando E a gente se amando Sem parar Quando chegar o momento Esse meu sofrimento Vou cobrar com juros, juro Todo esse amor reprimido Esse grito contido Este samba no escuro Você que inventou a tristeza Ora, tenha a fineza De desinventar Você vai pagar e é dobrado Cada lágrima rolada Nesse meu penar Apesar de você Amanhã há de ser Outro dia Inda pago pra ver O jardim florescer Qual você não queria Você vai se amargar Vendo o dia raiar Sem lhe pedir licença E eu vou morrer de rir Que esse dia há de vir Antes do que você pensa Apesar de você Amanhã há de ser Outro dia Você vai ter que ver A manhã renascer E esbanjar poesia Como vai se explicar Vendo o céu clarear De repente, impunemente Como vai abafar Nosso coro a cantar Na sua frente Apesar de você Amanhã há de ser Outro dia Você vai se dar mal Etc. e tal"

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