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Bob Dylan e o Nobel de Literatura 2016. Entenda a escolha.

  • Foto do escritor: Frank Moreira
    Frank Moreira
  • 15 de out. de 2016
  • 5 min de leitura

Eu vi muita gente falando sobre esse assunto desde o anúncio oficial. Sim, Bob Dylan ganhou o Prêmio Nobel de Literatura, honra máxima para que exerce a arte das letras. Um músico, com 75 anos comemorados em 24 de maio deste ano, famoso por suas composições e interpretações, venceu o Nobel de Literatura e essa notícia fez com que muita gente se manifestasse questionando o merecimento ou a falta de critério na premiação.

Li de tudo que se possa imaginar, mas os principais e mais repetidos argumentos são que a contribuição de Dylan foi para o mundo da música e que não se deve misturar as coisas. Li que muita gente muito melhor do que ele ficou de fora da indicação e que dentro dos indicados qualquer outro poderia ter ganhado em seu lugar.

Tenho que confessar que a primeira reação foi de achar a notícia inusitada e é inevitável não pensar que a premiação teve um pouco a ver com a fama e projeção do cantor e por isso seria muito mais fácil vir aqui e engrossar o coro daqueles que resolveram contestar o mérito da escolha. Preferi fazer diferente e corri atrás de informação. Escolhi conhecer melhor a carreira de Bob Dylan na literatura e entender qual o seu estilo e quais foram as razões para que ele fosse escolhido. Era difícil acreditar que seu nome apareceu do nada ou então só pelo seu talento musical havia sido nomeado, pois o Prêmio Nobel não é um concurso de colégio e sim a instituição de um marco, a gravação de um nome na história. Vale lembrar que alguns nomes imortais já receberam a honraria, como T.S. Eliot (1948), Winston Churchill (1953), Ernest Hemingway (1954), Pablo Neruda (1971), Gabriel Garcia Marquez (1982) e José Saramago (1998).



Antes de qualquer coisa, é preciso entendermos qual o critério para se escolher um vencedor do Nobel de Literatura e para tal podemos usar o conceito do próprio Alfred Nobel. Segundo ele é preciso que se escolha "o mais magnífico trabalho no campo literário" e por trabalho devemos entender toda a obra de um autor, sem que se faça alguma distinção de um produto em particular.

Robert Allan Zimmerman, ou Bob Dylan como ficou conhecido, nasceu nos Estados Unidos, na cidade de Duluth, Minesota. Já aos 10 anos escreveu suas primeiras poesias e desde novo já se envolveu com a música, tocando em várias bandas durante sua adolescência e sempre tendo como preferência o folk e o blues. No início da década de 60 Dylan se tornou famoso e daí para frente se consolidou como a lenda musical que todos conhecem. Seu segundo álbum, The Freewheelin' Bob Dylan, lançado em 1963, foi o grande salto na carreira e o início do real reconhecimento como compositor. Neste álbum surgiu uma de suas mais famosas composições, Blowin' in the wind.

No campo literário, Dylan escreveu mais de 30 livros e muitos deles foram reconhecidos como obras espetaculares e sua poesia sempre apareceu como parte viva do contexto que era apresentado em seus textos e suas composições. Sua escolha para o Nobel mostrou que a Academia Sueca (responsável pela premiação) entendeu que era possível separar as duas formas de arte em seu trabalho e conseguiu ver genialidade na composição escrita de forma a consolidar o conceito de que Dylan poderia ser avaliado como um escritor. A Academia nos explicou de forma didática os motivos por Dylan ter sido o escolhido e através de sua porta-voz, Sara Danius, divulgou que o escritor "criou novas expressões poéticas" dentro da tradicional canção americana" e criou uma correspondência entre seu trabalho e as obras dos poetas gregos Homero e Safo: "eles faziam poesia para ser ouvida e para ser apresentada com instrumentos. Dylan pode ser ouvido assim como pode ser lido, e deve ser lido. É um grande poeta da língua inglesa."


Fonte: www.veja.abril.com.br

A grande questão na premiação não é discutir o mérito de Bob Dylan e sim entender o que a Academia Sueca pensou ao indicá-lo e ao premiá-lo. O que aconteceu foi simples e inovador, pois a música e seu processo de criação foram separados em conceito, permitindo que um compositor seja encarado como o poeta que é e que seja avaliado pela sua capacidade de criar essa poesia, independente da forma como ela será representada. É possível entender esse critério como uma preocupação menor com o resultado final de uma obra e mais com o seu processo de concepção, entendendo que a arte presente em uma música, por exemplo, está muito mais naquilo que ela traz como mensagem e conteúdo e muito menos na sonoridade e arranjos que virão como consequência. Obviamente precisamos ter o discernimento de entender que será quase impossível vermos um outro compositor vencer uma premiação desse porte sem ter emplacado várias de suas canções entre os maiores sucessos de sua época.

Outro ponto que faz com que a discussão seja bem viva entre os literários é o fato de que Dylan não era considerado nem um pouco favorito ao prêmio desse ano e sua vitória fez com que muitos atribuíssem o resultado a um prêmio de consolação por nomeações anteriores. Os outros concorrentes para a premiação desse ano eram bastante renomados e entre eles estava o favoritíssimo, e best-seller, Haruki Murakami, japonês de 67 anos e autor da famosa trilogia 1Q84. Percebeu-se, com a não escolha do japonês, que a Academia estava em um ano de análise filosófica das obras dos autores e não preocupada com o alcance e força de venda do material, como já foi visto em anos anteriores.


Haruki Murakami - Fonte: www.duofox.com.br

Bob Dylan não é um artista qualquer e por mais que suas premiações em outras áreas não devam influenciar na escolha para um Nobel, é impossível pensar que seu currículo não pesou na hora de se escolher o vencedor. Eram doze Grammys (Música), um Oscar (Cinema), um globo de ouro (Cinema), um Pulitzer (Jornalismo e Composição Musical) e um Príncipe das Astúrias das Artes (Artes, em geral). Junto do rótulo de vencedor do Nobel de Literatura de 2016, Dylan receberá uma medalha e 8 milhões de Coroas Suecas (2,9 milhões de dólares) em uma cerimônia que acontecerá no dia 10 de dezembro.

Para conhecer um pouco mais do trabalho de Bob Dylan como escritor, segue a sugestão de algumas de suas obras com maior repercussão:


A grande pergunta que fica no ar é se a Academia irá passar a incluir os grandes compositores em sua lista de possíveis indicações. Temos algumas dezenas de excelentes nomes que poderiam aparecer como candidatos à honraria, mas pensar que esse caminho pode ser uma tendência também nos faz pensar que as polêmicas se multiplicarão. Será muito difícil o mundo da literatura aceitar que personagens do mundo da música passem a conquistar um espaço que antes não era comum a ambos, especialmente pelo fato de não haver recíproca. O Nobel é distribuído apenas para as áreas de Física, Literatura, Química, Fisiologia ou Medicina, Paz e Ciências Econômicas.



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