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Marcelo Oliveira é o único culpado do “fracasso” do Atlético?

  • Foto do escritor: Frank Moreira
    Frank Moreira
  • 24 de nov. de 2016
  • 10 min de leitura

É importante começar estabelecendo o conceito de fracasso no futebol brasileiro. Um time considerado grande como é o caso do Atlético, em um estado com somente duas forças de verdade e com uma torcida muito grande e apaixonada acaba criando seu próprio conceito de fracassar e ele, invariavelmente passa por se enquadrar em alguns dos pontos abaixo:


- Não vencer nenhum título;

- Não vencer o maior rival nenhuma vez no ano;

- Não convencer tecnicamente em uma análise da temporada como um todo;

- Não mostrar variação tática nos momentos em que foi surpreendido;

- Ter treinadores contestados durante a temporada;

- Oscilar de forma exagerada entre os momentos em uma competição;

- Perder força dentro de casa nos momentos decisivos;

- Contar com menos apoio de sua torcida em vários momentos de questionamento;

- Deixar uma sensação na mídia e nos torcedores que dava para ter ido além;

- Ficar atrás de times com elencos piores e que ganharam somente pela maior organização.


Se avaliarmos com atenção a lista acima, qual a diferença entre o Atlético e seu maior rival, Cruzeiro, no ano de 2016? Podemos atribuir o mesmo insucesso aos dois? Podemos concluir que os dois trabalhos foram ruins de verdade?


É aí que mora o perigo da generalização e do excesso de cobrança dos torcedores, especialmente quando se analisa um time e atribui ao seu treinador os resultados que não atenderam à expectativa que se criou no início de uma temporada. Cruzeiro e Atlético viveram em outra dimensão em 2016, pois enquanto o time celeste se afundou em atuações medíocres, contratações pífias, treinadores despreparados e um pingo de esperança com uma atuação mediana na última metade do Brasileirão o alvinegro sempre foi forte e favorito. Sempre esteve nas primeiras colocações, sempre teve o melhor elenco, sempre teve lampejos de futebol arte, sempre teve os artilheiros e destaques individuais do campeonato, sempre teve sorte/competência nas contratações e sempre teve o mínimo de uniformidade na relação entre o grupo de trabalho e a parte administrativa do clube.


Fonte: www.espn.com.br


O ano de 2016 deve terminar com cada um deles atendendo a pelo menos 90% dos itens que contribuem para o fracasso, mas nem isso os coloca no mesmo patamar ou os deixa com a mesma previsão para o próximo ano. O Cruzeiro tem em seu elenco jogadores incrivelmente ruins e que sempre deixam em todos a genuína curiosidade de como conseguem se manter sendo aproveitados em um clube desse tamanho. O bom trabalho da comissão técnica na segunda metade do ano até sugere um 2017 menos sofrido, mas ainda não há o menor motivo para se imaginar um ano que vem mais vitorioso do que o atual, especialmente por saber do potencial de seu maior rival.


Do lado atleticano, a base existe, está montada e é muito capacitada. Os problemas do elenco se resumem praticamente na defesa e nas lesões que maltrataram o planejamento do clube em 2016. Caso se reforce, entendendo que alguns veteranos podem faltar em algum momento, certamente o time sofrerá menos e não terá que ver em Edcarlos ou Gabriel as únicas alternativas da defesa, ou então ter que contar com juniores em posições importantes como na lateral e no meio de campo defensivo. Não há como se questionar o elenco do atlético e os dois setores mais avançados possuem alguns dos maiores nomes do futebol nacional. Rafael Carioca, Leandro Donizete, Junior Urso, Cazáres, Otero, Maicosuel, Robinho, Fred, Pratto, Luan e Clayton não seriam reservas em nenhum clube do Brasil e as diferenças de características entre eles ainda permitem variações no desenho do time para enfrentar qualquer tipo de defesa que o adversário possa apresentar.


Essa quantidade toda de informação serve, então, para reforçar o conceito de que Marcelo Oliveira é o responsável pelas decepções que o Atlético impôs aos seus torcedores nesse ano, correto? Como não aceitar que o coro que vemos nas ruas e que credita ao treinador a falta de capacidade do time é pertinente? Existe alguma análise que pode ser feita que retire dos ombros de Marcelo essa responsabilidade? Podemos trazer mais alguém para o banco dos réus?


Sou Cruzeirense e por isso me sinto extremamente confortável em falar sobre o Atlético sem ter que ser passional ou sem ter que escolher um lado para defender. Me considero isento até certo ponto e em um ano como esse, no qual eu só pude torcer pelo fim do sofrimento do meu time e pelo insucesso do Atlético, nada mais normal do que eu ter analisado detalhadamente o que o meu rival tinha de melhor e de pior desde o começo do ano. Com isso, afirmo categoricamente que posso apontar alguns bons argumentos para atenuar a responsabilidade de Marcelo Oliveira e de trazer aos olhos de quem quiser ver alguns outros nomes para dividir as honrarias com ele. Vamos começar o do começo.


Houve um momento no ano em que o Atlético era treinado por Aguirre e o treinador estrangeiro não era unanimidade e muito menos carismático o suficiente para contar com o apoio de todos no Atlético. É o tipo de treinador que precisa de tempo para implementar seu estilo, adequar o elenco e conseguir colocar na cabeça dos jogadores o que entende de futebol. Ele havia sido demitido do Internacional no ano anterior após ser eliminado em uma final de Libertadores e ter conquistado o título estadual mais uma vez e sua saída do Atlético acabou sendo semelhante em alguns aspectos. O time teve boas partidas sob seu comando e no estadual quase sempre foi a campo com vários reservas, se classificando para a final contra o América e também poupando jogadores para a Libertadores. Perdeu a final, mas perdeu jogando um jogo com jogador a menos e tomando um gol no final, fruto da incompetência individual dos jogadores que tiveram o título na mão e não souberam aproveitar. Foi eliminado na Libertadores de forma cruel, pois jogou melhor que o São Paulo, perdeu pelo gol fora de casa e ainda contou com um erro crasso da arbitragem que definiu o confronto. O motivo de sua demissão foi a impaciência da diretoria, da torcida e também da mídia, que não viu em Aguirre o tipo de treinador que ajudava em seu trabalho ou que dava a abertura necessária para defende-lo quando precisou. Além disso, Marcelo Oliveira estava no mercado, disponível, e o fato de ser um ídolo do passado e ter tido uma sequência tão vitoriosa nos últimos anos fazia com que “todos” esfregassem as mãos pelo acerto com o clube. Resumindo, a diretoria tem papel fundamental pela mudança de rumo do início do ano e da montagem do time para o que se recebeu depois, com outro estilo, outra dinâmica e outro nível de cobrança. Esperava-se de Marcelo o mesmo efeito que teve no Cruzeiro em 2013, quando chegou em um clube novo, com um elenco novo e conseguiu emplacar logo de início, caminhando com firmeza para o título nacional.


Em outra análise precisamos entender o papel negativo do torcedor. O atleticano, fanático e passional como sempre foi, mudou de estilo. Continua ao lado do clube como sempre, mas não passou impune pelos resultados que o Atlético ofereceu de 2012 para cá. Desde a chegada de Ronaldinho Gaúcho, do vice do brasileirão, da posterior conquista da Libertadores, da Copa do Brasil e de grande vantagem nos confrontos sobre o rival, o torcedor passou a esperar sempre o algo a mais e ignorou o fato histórico de que no Brasil isso é praticamente impossível de se sustentar por tantos anos. Não há registros de times que conseguiram mais de 3, 4 anos de glórias e ainda assim passando por muitas dificuldades. Nosso futebol é assim e mesmo quando se monta um esquadrão, como já houve anteriormente, eles sempre têm pontos falhos e deixam a desejar em algum aspecto. O nível dos nossos melhores times não é elevado o suficiente para se consolidar em uma dinastia ou em alguma forma de domínio absoluto e com isso eles perdem, são eliminados, desmontados, têm seus treinadores trocados e às vezes até caem de divisão, como o Internacional está para experimentar ao final do Brasileirão. O torcedor não pode esquecer disso e é preciso balancear o nível de cobrança, sabendo que tudo é permitido almejar, mas nem tudo é possível conseguir. A postura do torcedor do Atlético nesse ano de 2016 navegou entre a arrogância daqueles que têm os melhores times para torcer até o desespero dos que brigam para não cair e isso não combina em nada com a temporada sólida que o alvinegro mineiro ofereceu à massa atleticana. Um vice no Mineiro em condições especiais, uma eliminação injusta na Libertadores contra um outro gigante do futebol nacional e com erro de arbitragem, posições de destaque no Brasileirão e, no mínimo, um vice da Copa do Brasil. Não há como não pensar no torcedor colorado que até outro dia via seu time batendo o Barcelona na final do Mundial e que hoje perde a estribeira com o time praticamente na Série B e ainda tendo que ouvir o lado azul de Porto Alegre celebrar um possível título nacional depois de quase duas décadas de jejum.


Por último e até mais importante do que os dois apontamentos anteriores, o grupo de jogadores e sua postura e comprometimento (ou a falta dele, no caso). O elenco é fortíssimo e há mais de um jogador para quase todas as posições e isso acaba permitindo que haja sempre uma disputa que deve ser sadia pela titularidade. Muitas competições e as inevitáveis lesões acabam por dar oportunidades a todos e não há nenhum jogador de nível no elenco atleticano que possa reclamar por não ter tido a chance que precisava para se mostrar. Os times de Marcelo Oliveira jogam iguais desde que o mundo é mundo e o 4-2-3-1 aplicado pelo treinador é clássico, não surpreende ninguém mais, mas ainda é muito eficiente se somado à dedicação dos atletas que precisam entender suas funções dentro de um esquema tão interativo e exigente como esse. O 4-2-3-1 atual se resume a uma formação que permite a um time aproveitar o que há de melhor no ataque e na defesa, pois tem a primeira linha de quatro defensores sempre postada, normalmente com avanços alternados dos laterais, possui uma dupla de volantes que proporciona que um deles fique mais plantado e dando proteção à defesa e o outro saia no combate e ajuda na armação do time, uma dupla de meias laterais que atacam como pontas mas podem (e precisam) recuar para ajudar na marcação pelas laterais e possui dois jogadores mais avançados, um meia e um atacante, que ajudam na recomposição do meio campo sem recuarem demais e estão sempre prontos para receberem a segunda bola ou o passe para o gol. É simples assim e entender esse desenho não exige demais e é por isso que Marcelo obteve sucesso em todos os times que passou, independentemente da qualidade do futebol que jogou e da avaliação passional da torcida e da imprensa. No Coritiba foram duas finais de Copa do Brasil, dois Brasileiros e uma final de Copa do Brasil pelo Cruzeiro, um título de Copa do Brasil pelo Palmeiras e ao menos mais uma final pelo Atlético. O que fez isso funcionar dessa forma em quatro times diferentes, com histórias diferentes e com elencos tão diferentes foi o envolvimento dos atletas e a vontade real de fazer a coisa acontecer. Comprometimento é uma palavra muito usada no futebol e é isso que não se percebe no Atlético de Marcelo Oliveira. Percebe-se o talento, os rompantes, a categoria, o individual e até mesmo o ego inflado, mas jamais percebeu-se constância na dedicação e quase nunca foi possível acreditar que o time realmente queria fazer o que foi proposto pelo treinador. No time base desse ano é fácil de encontrar quem são aqueles que até contribuem com o talento ou com o brilhantismo em lances isolados, mas que deixam a desejar profundamente na hora de compor o esquema e de ajudar a dar a segurança que Marcelo e os torcedores gostariam de ter. Erazo é limitado e mostrou isso quando precisou ser o protagonista da defesa, pois vinha bem ao lado do comandante Leonardo Silva e caiu de rendimento de forma considerável. Com Gabriel ao seu lado não conseguiu assumir a postura de referência defensiva e ainda permitiu que o garoto acabasse passando por afobado ou inconsequente por várias vezes. O melhor meio de campo do time, selecionável, dono de técnica invejável e comparado com alguns grandes nomes do futebol mundial, Rafael Carioca, deixou de existir em determinado ponto da temporada e o seu poder de combate que já era limitado, virou nulo. O efeito prático dessa mudança de postura de Carioca foi uma consequente sobrecarga na defesa e em qualquer que fosse seu companheiro de meio campo. Não por acaso o volante virou reserva e ainda demonstrou toda sua insatisfação por isso, mas é fato que deixou de ser útil a partir do momento em que parou de marcar e começou a fingir que marcava. Os homens de frente do time são espetaculares, cada um com sua característica, mas praticamente todos compartilham o mesmo defeito: a marcação frouxa e a pouca combatividade na hora da recomposição e isso se transforma em pressão e conforto para os adversários saírem jogando e criarem suas chances no ataque. Os pontas, essencialmente Robinho, Clayton, Maicosuel, Hyuri ou qualquer outro que tenha atuado por ali sempre foram inoperantes na cobertura e na recomposição lateral e mesmo quando se esforçaram, sempre foi com o freio de mão puxado. Fred não marca absolutamente ninguém e sua raça e amor à camisa são parte do personagem que ele sempre oferece a quem está pagando seu salário. As exceções, Pratto e Luan, são sobrecarregados na ajuda defensiva e certamente sofrem ao perceberem que correm como malucos e não veem isso acontecendo com os demais companheiros de ataque.


Fonte: www.esportes.terra.com.br


Futebol é uma mistura de tradição, estilo, tática, técnica e vontade de vencer e, assustadoramente, na maioria das vezes, a vontade de vencer precisa ser a maior variável dessa equação. Os constantes resultados de equipes menos qualificadas contra os favoritos não acontecem por acaso e sim pelo desequilíbrio desses fatores no time que se julga mais capacitado. É preciso querer e saber vencer, é preciso entender que sem vibração, sem suor e sem entrega não há como escapar da derrota e que se o time se acha mais do que realmente é sempre vai haver alguém querendo mais do que ele do lado de lá. O futebol mostra isso todo santo dia e aqui no Brasil os exemplos são maiores e mais frequentes.


Mesmo que ainda não haja um campeão da Copa do Brasil antes de se terminar o segundo jogo, que ninguém acredite na estupidez de dizer que o Atlético perdeu para um time comum e somente mais organizado. O Grêmio não é comum, não tem um elenco comum e não tem uma base comum. Tem estilo, tem tradição, tem camisa, tem torcida, tem qualidade, tem tática e tem disciplina, muita disciplina. O Atlético foi surpreendido ontem por algo que não surpreende mais ninguém, especialmente pelo fato de o mesmo Grêmio ter feito a mesma coisa (até com menos qualidade do que ontem), no mesmo Mineirão contra o maior rival atleticano. Surpresa de verdade foi ver que o Atlético tinha a chance de salvar um ano muito questionado com um título extremamente importante, conquistando um bi-campeonato de porte que nunca veio e ofereceu uma atuação de Campeonato Mineiro ao seu torcedor e aos telespectadores.


O 1x3 não decide o título, mas o passo para o abismo foi dado com muita firmeza e os próximos dias devem ser de muita tensão da Cidade do Galo, pois dificilmente ficará pedra sobre pedra com a perda da final e com uma eventual classificação fora do G3. Começar 2017 com os holofotes voltados par ao time e ainda tendo que jogar duas fases eliminatórias para chegar à fase de grupos é tudo o que o Atleticano menos quer receber de presente de final de ano.

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