Carta de despedida ao meu avô do futebol
- João "Jones" Garcia
- 19 de set. de 2016
- 2 min de leitura
Foi na infância que descobri o futebol, assim como, nesta fase da vida nós descobrimos tantas outras coisas, mas nem de longe somos capazes de compreendê-las. Eu não compreendia o futebol, não enxergava padrões táticos, não conhecia os formatos dos campeonatos, nem ao menos sabia o nome de jogadores não badalados, mas você estava presente lá. Dentre todas as camisas infantis de times que tinha, uma era especial: a sua. Como eram bonitas aquelas faixas horizontais vermelhas e verdes. Ah! Portuguesa, você foi uma espécie de segundo clube para mim naquela época, assim como uma criança pequena vê em seu avô o seu segundo pai.
Como neto e avô, tivemos nossos momentos felizes e momentos tristes. Como chorei aos meus 5 anos, naquela derrota de 96. E nem sabia o que aquele jogo significava. Para mim, existia apenas a bipolaridade entre ser ou não campeão. Hoje, olho para trás e aprecio, orgulhosamente, o seu feito. Nos próximos dois anos não foi à final, mas chegou bastante perto. Fez bonito novamente. Que época.

Fonte: lifumea.blogspot.com
O tempo passou, avô. Eu passei de criança para adolescente e, finalmente, adulto. Conheci uma infinidade de coisas. Nem consigo me lembrar de tudo, e ainda tem tanta coisa lá fora para descobrir. Me interessei por outros campeonatos, outros esportes. O tempo passou, avô, e você envelheceu. Não conseguiu acompanhar as mudanças que aconteciam no seu tempo. Era um bom velhinho tradicional. Nos distanciamos bastante, mas ficaram guardadas em mim, as boas lembranças e o carinho. Vez ou outra, você ainda demonstrava lampejos de sua juventude. Lembra de 2011? As pessoas costumavam te chamar de “Barcelusa”.
A grande má notícia veio em 2013. Como em um acidente em que só os envolvidos sabem apontar as causas, você foi a maior vítima. Foi direto para o hospital e ficou internado. E de lá nunca mais saiu. Suas dívidas dobraram, e suas receitas despencaram. Assim como eu, muitas pessoas que sempre estiveram por perto, não estavam mais ao seu lado. Torciam e oravam de longe. As vezes achamos que fazemos o suficiente para o próximo, mas apenas rezar por você a distância pouco adiantava. Sua média de público caia a medida que seu estado ia piorando a e receita de bilheteria era irrisória. Você foi da Série B para C, e agora esta notícia que vai para a D. Sua casa foi penhorada e está prestes a ser leiloada. José Luiz Almeida é o terceiro médico em três anos responsável pelo seu tratamento e, assim como os outros dois anteriores, não parece conseguir reverter o quadro. Ele já disse que se nada mudar será o seu fim. E nos últimos três anos, nada mudou. Não para melhor.
Resolvi te escrever, enquanto ainda dá tempo, para me despedir caso amanhã chegue a notícia de seu falecimento e para agradecer pelo que você representou a mim quando eu era criança. Com carinho, adeus, Lusa.
Comments